O amor é um egoísmo. Não daqueles egoísmos ruins, quase mimados, que transtornam as pessoas à volta, mas um egoísmo bom. Como aquele de quando se tem um brinquedo que se gosta muito e não o empresta. Não por ser uma criança egoísta em essência, mas por querer preservar toda a beleza da virgindade daquele brinquedo novo. O simples toque estranho, o descuido, o descaso, poderia abrir uma fenda. Uma perda de sentido, de razão.
Assim se guarda o amor, como se guardava o brinquedo: o segurava e o apertava, quase o esmigalhava contra o peito num gesto seco de defesa e cuidado. E o apertava tanto e o resguardava tanto que o brinquedo, coitado, quase se partia nas sobras que ficavam entre a extremidade dos braços e o peito. Assim se guarda o amor: quase esmigalhado entre a extremidade dos abraços e a folgura dos desejos. Frágil e leve como uma molécula de água, se esconde entre os braços fortes, quase um fugitivo do prazer. Se desmancha e se acaba como o alvorecer. Duradouro e belo quase se eterniza durante os poucos momentos que existem. Passagem quase serena, desconsiderando as leves turbulências, talvez até tenha sido eternizada em alguma foto ou quadro. Após tal encontro, precisa de horas para se reerguer e se reencontrar. E vem, com força estrondosamente bela. Em tons de rosa, roxo, lilás e azul, tomando conta de tudo que observa. Enchendo de esperança até aqueles que já haviam esquecido há muito tempo o poder de tal observação. Vem-se o crepúsculo. Forte como o vento, mais intenso que a alvorada, forte e arrasador como uma boa noite de sexo. Figura-se nos rostos mais cansados. Culmina na noite, que é o encontro e a morte. Do dia e do amor. Que talvez reacorde. Talvez.
Como o boneco um dia há de reacordar e ser novamente usado, dessa vez talvez, perdida sua integridade bíblica, seja até partilhado. Aí nasce o amor entre duas pessoas. Da simples partilha de um algo comum. A passagem entre o Sol e a Lua. Crepúsculo e alvorada.
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